Respiração sem aparelhos do PIB brasileiro
Ao crescer 0,8% no terceiro trimestre de 2018, em relação ao período imediatamente antecedente, o produto interno bruto (PIB) brasileiro registrou acréscimo de 1,1% no ano e 1,4% em doze meses encerrados em setembro, de acordo com estimativas do Sistema de Contas Nacionais Trimestrais (SCNT), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O resultado acumulado até setembro esteve ancorado na variação verificada em serviços (1,4%) e indústria (0,9%), sendo que a agropecuária amargou retração de 0,3%. A expansão de serviços foi puxada por atividades imobiliárias (3,0%), comércio (2,8%) e transporte, armazenagem e correio (2,3%). No setor industrial, a categoria de transformação experimentou acréscimo de 2,3% e eletricidade e gás, água, esgoto, atividades de gestão de resíduos contabilizaram incremento de 1,5%, enquanto o ramo extrativo ficou estagnado e a construção civil encolheu 2,6%.
Pela ótica da demanda agregada, consumo das famílias e do governo avançaram 2,0% e 0,3%, respectivamente, em paralelo a subida de 4,5% da formação bruta de capital fixo, o que fez a taxa de investimento ascender a 16,9% do PIB, o maior patamar desde o 4º trimestre de 2009, sinalizando curso de revigoramento ainda represado pelas enormes margens de ociosidade de capacidade produtiva da época recessiva.
A melhor performance do consumo privado reproduz a conjugação entre tênue reativação do mercado de trabalho e diminuição do endividamento e inadimplência da população. Já o comportamento modesto das compras governamentais atesta os gigantescos problemas fiscais vivenciados pelas diferentes instâncias da administração pública.
No front externo, as importações experimentaram aumento de 9,4% e as exportações sofreram ampliação de apenas 1,5%, afetadas negativamente pelo delineamento da conjuntura de desaceleração da economia global, motivada pela combinação entre elevação dos juros nos Estados Unidos (EUA) – voltada à contenção das pressões inflacionárias derivadas da proximidade do pleno emprego – e a guerra comercial travada entre as duas maiores economias do planeta.
Como se vê, no caso brasileiro, trata-se de discreta recuperação cíclica, iniciada em abril de 2017, em resposta à orientação econômica “feijão com o arroz”, adotada pelo Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central (BC), do governo Temer, centrada em uma sucessão de cortes da taxa de Selic associada à estabilidade inflacionária, explicada pela expressiva ampliação da oferta agrícola e a pronunciada retração da demanda doméstica, por conta da maior e mais longa recessão da história da república.
A marcha de reativação foi interrompida com o forte abalo da confiança dos agentes, provocado pelo vazamento, em maio de 2017, de áudios comprometedores da postura ética do mandatário do país e a pronta “negociação suja” com o legislativo para arquivamento de dois processos encaminhados pela Procuradoria da Geral da República (PGR), visando à obtenção de autorização daquela casa para investigação do presidente pelo Supremo Tribunal Federal (STF) por corrupção passiva, organização criminosa e obstrução de justiça.
Tanto é assim que o PIB nacional cresceu apenas 0,4% entre julho e setembro de 2017 e 0,2% nos três trimestres subsequentes, retratando situação de acentuada perda de ritmo dos negócios, episódio normal em estágios de superação de profundas e prolongadas contrações dos níveis de atividade, agravado pela mistura indigesta entre os impactos da greve dos caminhoneiros, ocorrida em fins de maio de 2018, e as flutuações subjacentes ao ambiente político.
A saída da condição de letargia e a respiração sem aparelhos da ainda combalida economia brasileira, denotada no último trimestre, pode ser imputada à evolução e definição do quadro eleitoral que, ao permitir a observação, mesmo que de forma turva, da montagem de uma agenda econômica não intervencionista, destituída de artificialismos populistas, propiciou a renovação das esperanças dos atores na transformação do clima de reativação tímida em efetiva retomada expansiva.
A concretização desse desejo coletivo virtuoso depende, de um lado, dos humores da economia internacional, variável que escapa do controle das autoridades internas, e, de outro, da rápida e adequada utilização do capital político, conquistado pelo novo chefe de estado, para encaminhamento e implantação das reformas institucionais dirigidas à restauração das bases do equilíbrio financeiro do setor público e competitividade microeconômica.
O artigo foi escrito por Gilmar Mendes Lourenço que é economista, consultor, professor da FAE Business School e ex-diretor presidente do IPARDES.