Crédito e retomada do crescimento
Em meio a um clima de agravamento dos problemas sociais derivados da conjuntura recessiva, instalada no País desde o segundo trimestre de 2014, ladeado pelo quadro de aceleração da inflação e pelas perturbações de natureza política e institucional, maximizadas com a identificação de multiplicas ramificações da operação Lava Jato, o governo, anunciou, em reunião do Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social (CDES), a disponibilização de R$ 83 bilhões para ampliação da oferta de crédito, bancada essencialmente pelas instituições financeiras públicas.
No afã de promover a retomada do ciclo de negócios, serão ofertados R$ 17 bilhões para as linhas em consignação (cujas prestações são descontadas na folha de pagamento do tomador), garantidas por parte dos recursos do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS), R$ 10 bilhões para crédito rural, R$ 10 bilhões habitação, R$ 22 bilhões para infraestrutura, R$ 5 bilhões para a cobertura das necessidades de capital de giro das empresas, R$ 15 bilhões para as obras de infraestrutura e R$ 4 bilhões para alavancar as exportações.
Esse incentivo monetário representará acréscimo potencial de 2,6% no fluxo de crédito, algo pouco significativo, se for considerado o grau de desemprego dos fatores de produção (mão de obra e ativo fixo), prevalecente nas linhas fabris e nos estabelecimentos comerciais e de serviços, e os requerimentos de vultosas somas de haveres para aplicações na restauração da competitividade infraestrutural brasileira.
Há que atentar também que, diante do enorme endividamento do setor privado, sobretudo das famílias, e da convocação à participação dos bancos públicos – detentores de desempenho pouco satisfatório, nos tempos recentes -, no esforço de alargamento do financiamento, a panaceia do crédito pode implicar agravamento da doença que se tenta combater, e prosseguimento das pedaladas fiscais, compromisso perene das autoridades hospedadas no palácio do planalto.
De acordo com a Confederação Nacional do Comércio (CNC), a intenção de compra dos consumidores encontra-se no menor nível da série histórica, iniciada em 2010. Ademais, 62% das famílias brasileiras encontram-se endividadas, 24% com contas em atraso e 9% não fazem a menor ideia de como e quando quitar os débitos.
Na verdade, o CDES perdeu a oportunidade de engendrar a discussão a respeito de uma efetiva agenda de recuperação da capacidade sustentada de crescimento da nação. Aliás, não constitui qualquer surpresa um ente “chapa branca” simplesmente ignorar questões chave para a retirada do País do maior abismo recessivo da história.
Seria esperar demais que o CDES colocasse, na mesa de debates e decisões, temas como reindustrialização, produtividade, esforço exportador, política cambial, racionalização fiscal, desobstrução de pontos de estrangulamento, reformas estruturais (tributária, fiscal, administrativa, patrimonial, etc.), desburocratização, dentre outros itens indispensáveis para a minimização de custos e a melhoria da eficiência do sistema econômico operante no País.
Na falta disso sobrou adotar a cômoda e eterna receita do crédito subsidiado – à custa dos fundos dos trabalhadores, geridos por entidades oficiais, de eficácia duvidosa – que não fará nem cócegas no PIB. No fundo, tenta-se abrandar, ainda que temporariamente, as agruras da recessão, enquanto se reconstroem as alianças políticas para desmanchar os riscos de impeachment e juntar os cacos para o jogo das eleições municipais. E a culpa continua sendo da crise internacional.
O artigo foi escrito por Gilmar Mendes Lourenço, Economista, Consultor, Professor da FAE Business School, e ex-presidente do IPARDES.