Dezembro é o mês mais estratégico para o RH

Movimentações internas, intenção de saída e vagas abertas em dezembro funcionam como indicadores para o início do ano seguinte
Tradicionalmente associado ao fechamento de ciclos e a tarefas administrativas, o mês de dezembro costuma ser tratado como um período operacional dentro das áreas de Recursos Humanos. Para Augusto Frazão, CEO e cofundador do InHire, essa leitura é limitada e faz com que muitas empresas deixem de aproveitar um dos momentos mais ricos em informação sobre o futuro próximo do negócio.
Na avaliação do executivo, o último mês do ano concentra sinais claros sobre o comportamento das pessoas e sobre como a organização tende a iniciar o ano seguinte. “Dezembro é o mês que mais oferece dados reais sobre o que vai acontecer com a empresa nos primeiros trimestres do próximo ano”, afirma. Ainda assim, segundo ele, essas informações raramente são analisadas de forma estratégica.
Um dos fatores que torna essa análise ainda mais relevante no Brasil é o contexto de alta rotatividade de trabalhadores no mercado. Segundo levantamento da consultoria Robert Half com dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (CAGED), o país apresenta cerca de 56% de rotatividade de funcionários por ano, um dos mais altos do mundo. Esse padrão evidencia que movimentos de saída e entrada de profissionais não são isolados e que períodos de transição, como dezembro, podem fornecer sinais valiosos sobre esses comportamentos.
Boa parte das decisões mais sensíveis relacionadas a pessoas já começa a se desenhar antes da virada do calendário. É nesse período que muitos profissionais decidem se permanecem ou não nas empresas. Como explica Augusto, as demissões voluntárias que aparecem em janeiro geralmente têm origem em insatisfações acumuladas ao longo do ano, como avaliações mal conduzidas, falta de perspectiva de crescimento ou feedbacks desalinhados. O pedido formal vem depois, mas a decisão é anterior.
Comportamentos sazonais também se aplicam ao RH
A lógica, segundo o CEO do InHire, HRTech focada em recrutamento e seleção que usa dados e inteligência artificial para simplificar processos e colocar a experiência do candidato como pilar central, não é diferente do que já acontece em áreas como Marketing e Produto, que há décadas trabalham com o conceito de sazonalidade comportamental. Assim como eventos como a Black Friday ajudam a antecipar movimentos de consumo, dezembro pode funcionar como um grande termômetro do clima organizacional e das decisões individuais dentro das empresas.
A ausência de dados analíticos nesse período reforça a necessidade de olhar mais atentamente para ele. Uma pesquisa da LCA Consultores, também com base em informações do CAGED, mostrou que, entre trabalhadores com carteira assinada no Brasil, 36% mudaram de emprego voluntariamente ao longo de um ano — o maior percentual desde 2004.
Um dos sinais mais evidentes da intenção de mudança profissional está no aumento dos pedidos de movimentação interna. “No fim do ano, cresce a busca por mudanças de área ou de função: um movimento que pode revelar problemas estruturais. Essas movimentações costumam indicar falhas na gestão, lacunas no desenvolvimento de carreira ou desalinhamentos que não foram endereçados ao longo do ciclo”, afirma Augusto.
Outro alerta importante aparece nas vagas que permanecem abertas até dezembro sem avanço significativo. Quando isso acontece, o impacto tende a ser direto no primeiro trimestre do ano seguinte. Muitas vezes, os entraves entre liderança e recrutamento já estão claros, mas acabam sendo adiados sob a justificativa de “esperar o ano virar”.
Marca empregadora em jogo
Além dos impactos internos, dezembro também é um período decisivo para a marca empregadora, ou seja, a forma como a empresa é percebida por quem já trabalha nela e por profissionais que avaliam uma possível mudança de emprego. É justamente nesse momento que muitos profissionais começam a planejar transições de carreira para o início do ano seguinte. Se a empresa se mostra ausente, desorganizada ou com processos pouco claros nas semanas finais do ano, perde espaço no momento de maior intenção de mudança.
Augusto compara esse cenário à lógica dos consumer insights. No contexto do RH, explica, o comportamento analisado é o de colaboradores, candidatos e gestores. Dezembro concentra um volume expressivo desses dados e oferece uma leitura privilegiada sobre expectativas, frustrações e intenções futuras.
Planejamento mais realista para o ano seguinte
Quando o RH passa a interpretar esses sinais, os ganhos vão além da área. A análise estruturada de dezembro permite antecipar riscos de saída, revisar estruturas desalinhadas, ajustar metas de contratação e desenhar estratégias de retenção mais precisas. “Esses dados ajudam inclusive a orientar o núcleo financeiro sobre riscos orçamentários futuros, com base em comportamento real, e não em suposições”, afirma o executivo.
Para isso, Augusto recomenda que líderes de RH criem rotinas específicas de análise para o período, comparem os dados com ciclos anteriores e transformem as reuniões de encerramento em espaços reais de escuta. Em sua visão, tratar dezembro apenas como um encerramento é um erro estratégico. “Ele deveria ser visto como ponto de partida para o planejamento do ano seguinte.”
Portanto, ignorar os sinais desse mês é desperdiçar uma vantagem competitiva importante. “Trata-se de uma espécie de pesquisa de mercado pronta, baseada em dados reais, atualizados e de alto impacto para as decisões do próximo ciclo, mas que ainda passa despercebida em muitas organizações”, conclui Augusto.








