Fome X Desperdício: uma equação que tem solução

Fome X Desperdício: uma equação que tem solução

Programa Mesa Brasil Sesc vem combatendo a fome e diminuindo o desperdício de alimentos

Mesmo com o aumento da produção global de alimentos, a fome continua sendo o maior problema mundial, alerta a Organização das Nações Unidas (ONU). A fome produz graves consequências no desenvolvimento social e econômico das populações, além do crescimento da vulnerabilidade social.

No caso específico do Brasil, que deve terminar 2023 como o quarto país com maior produção agrícola do mundo, atrás apenas da China, Índia e Estados Unidos, é difícil imaginar que 15% da população não têm o que comer diariamente.

De acordo com informações da Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Penssan), mais de 33 milhões de brasileiros estão passando fome. Este número é quase o dobro do contingente estimado em 2020, primeiro ano da pandemia de Covid-19.

Desperdício

Por outro lado, enquanto muitas pessoas passam fome e outras tantas morrem por não ter o que comer, o desperdício de alimentos é um grave problema que tem se agravado. De acordo com dados do IBGE, cerca de 30% dos alimentos produzidos no país acabam sendo jogados fora, o equivalente a cerca de 46 milhões de toneladas de alimentos por ano.

Isso representa uma perda significativa tanto em termos econômicos, já que o desperdício de alimentos no Brasil é estimado em R$ 61,3 bilhões por ano, colocando o País na 10ª posição no ranking de nações que mais desperdiçam comida, segundo dados da ONU.

Em meio a um quadro preocupante, que é a fome e o desperdício, a solidariedade tem sido a pedra angular da sobrevivência. Um dos programas que está contribuindo para mudar esse cenário é o Mesa Brasil Sesc. Aliás, no ano em que a Federação do Comércio do Paraná completa 75 anos, o Mesa Brasil Sesc tem se destacado regionalmente, permitindo que instituições de caridade, entidades de filantropia e ongs possam alimentar um número maior de pessoas, que têm nessas refeições a única forma de receber um alimento saudável e suficiente para se manter vivos.

O Mesa Brasil Sesc é uma rede nacional de bancos de alimentos que combate a fome e o desperdício, a partir de doações de 3 mil parceiros, e contribui para a garantia da segurança alimentar e nutricional de crianças, jovens, adultos e idosos, em vulnerabilidade social, em todo o Brasil.

O programa começou por São Paulo, em 1994. Como os resultados foram positivos, em 2003, o Departamento Nacional do Sesc decidiu expandir para todos os estados brasileiros e mais o Distrito Federal.

No Sesc Paraná, o Mesa Brasil foi implantado em 2003. Nestes 20 anos, foram arrecadados e distribuídos mais de 36 milhões de quilos de alimentos, beneficiando anualmente mais de 160 mil pessoas. Atualmente, no Paraná, 400 empresas fazem doações para o Mesa Brasil.

O programa está presente em Curitiba, Francisco Beltrão, Guarapuava, Cascavel, Campo Mourão, Maringá e Londrina, e atende também mais 100 municípios da área de abrangência, totalizando 107 municípios do estado.

Em Curitiba e região metropolitana, 215 instituições de caridade e filantropia são beneficiadas pelas doações de 120 doadores, que alimentam 55 mil pessoas, informa a nutricionista e coordenadora do Mesa Brasil Parolin, Tayenne Oleinik Cochek.

Parceiros são fundamentais para a sobrevivência do programa

Entre empresas, fazer parcerias é essencial para o crescimento dos negócios. Trata-se de relações comerciais baseadas na colaboração. Em uma parceria, ambas as partes têm benefícios que as incentiva a fecharem um acordo. Assim, elas se unem em prol de um objetivo em comum.

No caso do Mesa Brasil Sesc, as parcerias são fundamentais. Sem parceiros, o programa não tem como seguir.

Os parceiros doadores do programa Mesa Brasil são supermercados, atacados, produtores rurais, centrais de distribuição e indústrias de alimentos, além de empresas de diversos ramos de atividade, que doam seus excedentes de produção e alimentos fora dos padrões de comercialização, mas em condições seguras, próprios para o consumo.

De acordo com a coordenadora do Mesa Brasil Parolin, 80% das doações são de produtos que perderam o valor comercial. Segundo Tayenne, a meta no Paraná é arrecadar, por ano, 3 milhões de quilos de alimentos, sendo 1,5 milhão só na unidade Parolin.

Ainda segundo a coordenadora, a partir de agosto, o Mesa Brasil Parolin está promovendo campanhas para incentivar funcionários de diversas empresas a fazerem individualmente suas doações. Também está mantendo contato com produtores de eventos para que volte o ingresso solidário com desconto para quem fizer doações de alimentos.

Ações educativas ajudam a diminuir o desperdício

As cascas são tão nutritivas quanto a polpa.

O trabalho do Mesa Brasil Sesc vai além da distribuição de alimentos. O programa desenvolve ações educativas nas áreas de Nutrição e Serviço Social, com o objetivo de promover uma alimentação adequada e fortalecer a gestão das entidades sociais assistidas.

A dimensão educativa é um diferencial, uma vez que procura potencializar o trabalho por meio da formação de agentes multiplicadores, desenvolvendo a autonomia das Instituições.

Tayenne Oleinik Cochek explica que como a maioria dos alimentos está próximo do vencimento, as pessoas que fazem parte das instituições que recebem as doações precisam ser instruídas através de cursos, oficinas e treinamentos a melhor utilizarem os produtos, evitando o desperdício.

Poucas pessoas sabem, mas os alimentos têm seis partes: casca, entrecasca, folha, talo, semente e polpa. Entretanto, para fazer este alimento, usa-se, na maioria das vezes, apenas uma parte. Ou seja, joga-se fora cinco partes de seis. Se esse alimento for usado totalmente, estará se economizando e ainda não haverá desperdícios.

Os tomates muito maduros e começando a se deteriorar, por exemplo, podem ser transformados em molho.

As cascas, entrecascas, folhas, talos e sementes são partes tão nutritivas quanto a polpa. O incentivo ao aproveitamento, culturalmente pouco difundido no país, busca minimizar a quantidade de alimentos que iriam para o lixo em perfeitas condições de consumo. Isso se faz por meio do aprimoramento de habilidades culinárias que permitam utilizá-los de forma integral e criar pratos saborosos e nutritivos, destaca a nutricionista.

Na verdade, o desperdício deve ser trabalhado em todas as pontas da cadeia alimentícia, começando pelo plantio ao recebedor, passando pelo fornecedor e o doador. Todos precisam entender que tudo que se joga no lixo não é lixo. É comida. Não é sujo nem contaminado, muito menos exótico.

A conscientização sobre o desperdício já é visível. De acordo com a coordenadora do Mesa Brasil Parolin, o desperdício diminuiu consideravelmente depois da pandemia, principalmente em supermercados e centrais de abastecimento. Se por um lado isso é positivo, por outro, é menos alimento destinado para doação.

Em 2020, dados da Associação Brasileira de Supermercados (Abras) apontaram um desperdício de R$ 3,6 bilhões em alimentos.  O principal motivo foi a necessidade da troca de estoque devido ao prazo de validade dos produtos não adquiridos pelos consumidores.

Atualmente, o desperdício nos super e hipermercados vem sendo reduzido através da tecnologia. Um exemplo é a criação de aplicativos que medem o índice de tudo aquilo que vira lixo sem necessidade.  A ideia é que produtos com prazo de validade próximo sejam identificados com antecedência para que possam ser destinados aos consumidores com preços abaixo do praticado nas prateleiras.

Outras soluções que podem diminuir o desperdício são o maior controle do estoque, revisão dos processos operacionais e, principalmente, a educação dos consumidores.

Não existem números oficiais divulgados pela Associação Brasileira dos Supermercados de quanto foi a queda do desperdício desde a pandemia de Covid-19, mas ela é sentida pelo número de doações recebidas pelas entidades sociais.

Do doador às instituições: muito trabalho e dedicação

Laelson Alves trabalha há 34 anos no Sesc e há uma década faz parte do Mesa Brasil.

As setes sedes de armazenamento no Paraná do Mesa Brasil Sesc contam com 15 veículos, todos refrigerados, para garantir a conservação dos alimentos. Do recebimento dos produtos das 400 empresas parceiras até a entrega às entidades cadastradas, tudo é planejado detalhadamente para assegurar a higiene e a conservação adequada dos alimentos.

O assistente técnico administrativo do Mesa Brasil Sesc Parolin, Laelson Alves, que trabalha há 34 anos no Sesc, dos quais, 10 no Mesa Brasil, explica que as doações são coletadas diariamente pela manhã e à tarde e transportadas para a sede onde funciona o programa. No local, os alimentos são acondicionados conforme suas necessidades de conservação, separados e disponibilizados para retirada pelas entidades sociais.

O Mesa Brasil Parolin conta com quatro vans e um caminhão, mas segundo Alves, se houvesse um número maior de veículos, a coleta seria bem maior.

Confira a fala do assistente técnico administrativo do Mesa Brasil Sesc Parolin, Laelson Alves:

Veja quem tem prioridade para receber as doações

O Mesa Brasil Sesc Paraná prioriza pessoas em situação de vulnerabilidade social e nutricional, assistidas pelas entidades cadastradas no programa. São instituições de longa permanência de crianças e idosos, creches comunitárias, instituições de acolhimento a idosos, crianças, adultos, dependentes químicos, pessoas em situação de rua e outros públicos necessitados de atenção.

A coordenadora e nutricionista do Mesa Brasil Sesc Parolin, Tayenne Oleinik Cochek, informa que o programa não fornece a refeição completa, mas complementa e reforça a alimentação, agregando valor nutricional à mesa dessas pessoas.

Além do tradicional feijão e arroz, frutas e verduras, empresas parceiras têm feito a festa para criançada com a doação de chocolate e até trufas.

Para fazer parte do Programa as entidades devem atender a alguns critérios de inscrição e cadastramento e a permanência está condicionada à participação nas ações educativas, permissão para visitas de acompanhamento realizada pelos técnicos do Programa e demais atividades que são acordadas previamente.

O Mesa Brasil também atua em caráter emergencial, junto a populações vítimas de catástrofes ou calamidades públicas de qualquer natureza. Com um trabalho de logística humanitária é realizada uma grande corrente de solidariedade, ativada pelo Sesc e aderida por inúmeros parceiros, sempre que ocorrem situações de emergência no país. Todas as atividades são coordenadas pelo Mesa Brasil Sesc, que mobiliza cidadãos e empresas para ajudar a essas pessoas em situação de risco.

Associação em Campo Largo só sobrevive de doações

Claudete Slompo é coordenadora da Associação dos Deficientes Físicos de Campo Largo (ADFCL), uma das 215 instituições beneficiadas pelo programa Mesa Brasil Sesc Parolin. Há sete anos, uma vez por semana, ela se desloca da Vila Bancária de Campo Largo para o bairro Parolin, em Curitiba, para receber as doações do Mesa Brasil Sesc Parolin.

A ADFCL foi fundada em 2005 com a finalidade de atender pessoas com necessidade especial. No momento são atendidas 80 pessoas, entre crianças e adultos e segundo Claudete, a entidade sobrevive de doações, mas também promove a inserção social através de políticas públicas inclusivas em parceria com diversos setores da sociedade.

Com os alimentos que recebe de doação são preparadas três refeições, que incluem café da manhã, almoço e lanche da tarde, de segunda à sexta-feira.

“Além de alimentar os participantes da Associação, os acompanhantes também são beneficiados com três refeições diárias. O dinheiro que economizamos com a compra de alimentos, que recebemos de doações, utilizamos para o pagamento de tratamentos ou compra de equipamentos para beneficiar as pessoas que atendemos”, informa a coordenadora da Associação dos Deficientes Físicos de Campo Largo.

O que pode ser doado?

A doação de alimentos ou serviços é um ato de responsabilidade social e fortalece a imagem da empresa junto ao público. O consumidor atual se identifica com organizações que praticam os mesmos valores que os seus e busca se aproximar de marcas engajadas com causas sociais, econômicas e ambientais.

Confira os produtos e serviços que podem ser doados ao Mesa Brasil Sesc:

  • Alimentos excedentes de produção ou fora dos padrões de comercialização, mas ainda próprios para o consumo;
    • Produtos de limpeza e higiene pessoal;
    • Embalagens descartáveis;
    • Serviços de transporte;
    • Trabalho voluntário em atividades operacionais e educativas;
    • Recursos financeiros;
    ​• Outros serviços.

Benefícios aos parceiros

As empresas doadoras também ganham. A parceria com o Mesa Brasil Sesc oferece os seguintes benefícios:

• Capacitações ao seu corpo de colaboradores/funcionários (ações educativas);
• ​Redução de despesas com o descarte de alimentos e produtos excedentes ou sem valor comercial, mas ainda próprios ao consumo humano;
• Isenção de ICMS;
• Diminuição dos custos de logística para destinação de produtos sem valor comercial;
• Oportunidade de voluntariado corporativo;
• Contribuição para a qualidade e a diversidade das refeições oferecidas nas entidades sociais.
• Divulgação compartilhada da parceria.

Rastreabilidade online

O Mesa Brasil Sesc Paraná é pioneiro na implantação do Relatório de Rastreabilidade online. Assim o doador pode acompanhar o destino de sua doação e verificar quem está sendo beneficiado com ela. “Isso mostra segurança, transparência e prestação de contas diária”, explica a coordenadora Tayenne Oleinik Cochek.

Reportagem e edição – Mirian Gasparin/ Gravação dos vídeos e fotos- Otávio Fiore (estagiário)

Mirian Gasparin

Mirian Gasparin, natural de Curitiba, é formada em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo pela Universidade Federal do Paraná e pós-graduada em Finanças Corporativas pela Universidade Federal do Paraná. Profissional com experiência de 50 anos na área de jornalismo, sendo 48 somente na área econômica, com trabalhos pela Rádio Cultura de Curitiba, Jornal Indústria & Comércio e Jornal Gazeta do Povo. Também foi assessora de imprensa das Secretarias de Estado da Fazenda, da Indústria, Comércio e Desenvolvimento Econômico e da Comunicação Social. Desde abril de 2006 é colunista de Negócios da Rádio BandNews Curitiba e escreveu para a revista Soluções do Sebrae/PR. Também é professora titular nos cursos de Jornalismo e Ciências Contábeis da Universidade Tuiuti do Paraná. Ministra cursos para empresários e executivos de empresas paranaenses, de São Paulo e Rio de Janeiro sobre Comunicação e Língua Portuguesa e faz palestras sobre Investimentos. Em julho de 2007 veio um novo desafio profissional, com o blog de Economia no Portal Jornale. Em abril de 2013 passou a ter um blog de Economia no portal Jornal e Notícias. E a partir de maio de 2014, quando completou 40 anos de jornalismo, lançou seu blog independente. Nestes 16 anos de blog, mais de 35 mil matérias foram postadas. Ao longo de sua carreira recebeu 20 prêmios, com destaque para o VII Prêmio Fecomércio de Jornalismo (1º e 3º lugar na categoria webjornalismo em 2023); Prêmio Fecomércio de Jornalismo (1º lugar Internet em 2017 e 2016);Prêmio Sistema Fiep de Jornalismo (1º lugar Internet – 2014 e 3º lugar Internet – 2015); Melhor Jornalista de Economia do Paraná concedido pelo Conselho Regional de Economia do Paraná (agosto de 2010); Prêmio Associação Comercial do Paraná de Jornalismo de Economia (outubro de 2010), Destaque do Jornalismo Econômico do Paraná -Shopping Novo Batel (março de 2011). Em dezembro de 2009 ganhou o prêmio Destaque em Radiodifusão nos Melhores do Ano do jornal Diário Popular. Demais prêmios: Prêmio Ceag de Jornalismo, Centro de Apoio à Pequena e Média Empresa do Paraná, atual Sebrae (1987), Prêmio Cidade de Curitiba na categoria Jornalismo Econômico da Câmara Municipal de Curitiba (1990), Prêmio Qualidade Paraná, da International, Exporters Services (1991), Prêmio Abril de Jornalismo, Editora Abril (1992), Prêmio destaque de Jornalismo Econômico, Fiat Allis (1993), Prêmio Mercosul e o Paraná, Federação das Indústrias do Estado do Paraná (1995), As mulheres pioneiras no jornalismo do Paraná, Conselho Estadual da Mulher do Paraná (1996), Mulher de Destaque, Câmara Municipal de Curitiba (1999), Reconhecimento profissional, Sindicato dos Engenheiros do Estado do Paraná (2005), Reconhecimento profissional, Rotary Club de Curitiba Gralha Azul (2005). Faz parte da publicação “Jornalistas Brasileiros – Quem é quem no Jornalismo de Economia”, livro organizado por Eduardo Ribeiro e Engel Paschoal que traz os maiores nomes do Jornalismo Econômico brasileiro.

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