Em meio a ações de Trump, Brasil deve diversificar parcerias

Em meio a ações de Trump, Brasil deve diversificar parcerias

É hora de dar aos EUA o isolamento, diz relatora da ONU

Com menos de um mês de mandato, o presidente estadunidense, Donald Trump, não passa um dia de seu governo sem fazer declarações que desagradam países vizinhos ou parceiros estratégicos de longa data. Entre os anúncios, estão novas tarifas para produtos importados de nações como China, México e Canadá, incluindo itens como o aço e o alumínio.

Além disso, Trump tem feitos ameaças diretas aos Brics, em relação à implantação de altas tarifas de importação caso os países decidam fazer trocas comerciais em moeda própria (em vez do dólar).

As atitudes polêmicas passam por ameaçar a soberania de outros povos e nações, como as declarações acerca de retomar o Canal do Panamá, passar a controlar a Groenlândia (um território autônomo dentro do Reino da Dinamarca) e transformar o Canadá em um estado norte-americano.

Houve também afrontas ao multilateralismo e aos sistemas de governança global, ao retirar os Estados Unidos da Organização Mundial da Saúde (OMS) e do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas.

Trump decidiu opinar na questão palestina e declarou que pretende controlar a Faixa de Gaza, região devastada por bombardeios israelenses nos últimos meses, e expulsar os palestinos do território, enviando-os forçadamente para países como o Egito e a Jordânia.

A última declaração, que contraria o direito internacional, fez com que a relatora especial da UNHRC (a sigla, em português, Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados) para Israel e os Territórios Ocupados Palestinos, Francesca Albanese, encorajasse a comunidade internacional a isolar os Estados Unidos.

“A comunidade internacional é feita por 193 países e é hora de dar aos Estados Unidos o que ele tem buscado, que é o isolamento”, disse a relatora, em coletiva após Trump fazer a proposta sobre Gaza.

Isolamento

Os EUA ainda são a maior economia do mundo. O país é considerado a maior potência militar do mundo, o que inclui bases espalhadas por todo o planeta, e proporciona ajuda financeira a diversas nações.

No entanto, Evandro Carvalho, doutor em direito internacional e professor da Universidade Federal Fluminense (UFF), afirma que nenhum país é autossuficiente a ponto de conseguir se manter isolado completamente das relações internacionais, mesmo os Estados Unidos.

“A economia de um país depende das interações com outras economias, dentro daquela lógica de buscar oportunidades no mercado internacional para baratear custos. Tanto o importador quanto o exportador estão atentos às oportunidades que estão fora das fronteiras do país onde sua empresa tem sede. Uma parte significativa da economia dos Estados Unidos depende das exportações e importações”.

Segundo o professor, na medida em que Trump adota essa postura “pouco diplomática” em relação a outros países, ele pode gerar uma reação dessas nações.

“Ao verificar que os Estados Unidos se tornaram um país fora do controle, e isso, em parte, é muito verdade, os países tendem a se reunir, não necessariamente em um consenso global contra os Estados Unidos, mas no sentido de convergir na direção de conter esse país. Todos os países começarão a tomar iniciativas, de maneira organizada ou com uma convergência, para amarrar o ‘gigante Gulliver’. Essa atuação de Donald Trump, de fato, tende a isolar ainda mais os Estados Unidos, agravando a perda de credibilidade e a legitimidade da liderança do país no sistema internacional”, explica Carvalho.

A presidente da Comissão Europeia, Ursula Von der Leyen, por exemplo, usou suas redes sociais, nesta terça-feira (11), para criticar a decisão de Trump de taxar o aço e o alumínio e prometeu medidas para proteger os interesses dos países do bloco.

“Lamento profundamente a decisão dos EUA de impor tarifas nas exportações de aço e alumínio europeus. A União Europeia agirá para salvaguardar seus interesses econômicos. Nós protegeremos nossos trabalhadores, negócios e consumidores”, escreveu Ursula Von der Leyen.

Ana Garcia, pesquisadora do Brics Policy Center, acredita, no entanto, que os Estados Unidos não podem ser facilmente isolados, por serem, entre outros motivos, o maior mercado consumidor e um importante centro de produção.

“Os Estados Unidos não podem ser facilmente isolados por nenhum país ou bloco. Eles são ainda o epicentro das cadeias de produção. Isso não é possível, a não ser que os países agissem conjuntamente. Não é possível politicamente. Você não vai ter a União Europeia agindo conjuntamente com a China, por exemplo”, afirma a pesquisadora.

Brasil

Entretanto, é possível que ocorram substituições dos EUA nas relações bilaterais, ocorrendo ano após ano, como no caso da China, que substituiu os Estados Unidos como principal parceiro comercial do Brasil nos últimos anos. “A gente tem a ideia de que seria o mundo ideal, a gente poder prescindir dos americanos e ter um mundo mais multipolar, mas isso ainda não é possível”.

Para o professor de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo (USP) Pedro Dallari, as agressões dos EUA aos direitos humanos, em especial o tratamento dado aos imigrantes e aos palestinos, devem ser contrapostas firmemente pela comunidade internacional.

Em relação às medidas econômicas, esta é uma oportunidade para os países, inclusive o Brasil, buscarem parceiros alternativos. “No que se refere às medidas econômicas adotadas pelo governo dos EUA, a posição do Brasil deve ser pragmática, alinhada aos interesses da sociedade brasileira. Indiscutivelmente, uma ação prudente é aumentar a diversidade de parceiros comerciais, sendo prioridade, neste momento, a entrada em vigor do acordo entre Mercosul e União Europeia”, destaca Dallari.

Os Brics podem ser um caminho para o Brasil, em uma situação em que o comércio com os EUA se torne desvantajoso. A hegemonia da China, país com maior participação no comércio global, dentro do Brics deve permanecer, segundo Dallari. Mas, para Eduardo Carvalho, o Brasil deve olhar para os outros países-membros.

“Há uma imensa oportunidade na cúpula que ocorrerá este ano aqui no Brasil para se discutir o comércio intra Brics. Hoje há uma relação comercial intensa de todos os países com a China. Mas a relação do Brasil com a Índia, Rússia, África do Sul e os novos membros, Egito, Etiópia, Emirados Árabes Unidos e Irã, tem espaço para crescer. É preciso identificar onde estão as vantagens competitivas”, afirma Carvalho.

Ana Garcia lamenta que o comércio do Brasil com os outros países do Brics ainda seja muito pequeno e que todos os membros do grupo ainda dependam muito do comércio com a China.

“A China seria a única potência que poderia vir a jogar esse papel de tentar contornar [as políticas protecionistas dos EUA]. Cada vez que o Trump age de maneira a restringir comércio, investimento, ele está dando um passo contrário a si mesmo, de abrir espaço para a China. Mas ainda assim não em todos os setores”.

Para a pesquisadora, o Brasil deveria diversificar suas relações comerciais, de forma a não depender tanto de nenhum país, sejam os Estados Unidos seja a China. “O mundo ideal seria uma diversificação das relações comerciais, incluindo, a Europa e outros países. Mas fortalecer primordialmente, as relações sul-sul do Brasil. Aí, sim, a gente teria talvez um diferencial para lidar com os parceiros de forma mais equânime”.

Ana Garcia lamenta que o Brasil tenha deixado de lado seu papel de liderança dentro da América Latina e as suas relações com a África e o Oriente Médio, que marcaram os primeiros mandatos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em prol de assuntos mais globais como os Brics e o G20. “Seria importante a diversificação e a busca de parcerias mais equânimes para as relações comerciais, mas também para os fóruns multilaterais”.

Mirian Gasparin

Mirian Gasparin, natural de Curitiba, é formada em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo pela Universidade Federal do Paraná e pós-graduada em Finanças Corporativas pela Universidade Federal do Paraná. Profissional com experiência de 50 anos na área de jornalismo, sendo 48 somente na área econômica, com trabalhos pela Rádio Cultura de Curitiba, Jornal Indústria & Comércio e Jornal Gazeta do Povo. Também foi assessora de imprensa das Secretarias de Estado da Fazenda, da Indústria, Comércio e Desenvolvimento Econômico e da Comunicação Social. Desde abril de 2006 é colunista de Negócios da Rádio BandNews Curitiba e escreveu para a revista Soluções do Sebrae/PR. Também é professora titular nos cursos de Jornalismo e Ciências Contábeis da Universidade Tuiuti do Paraná. Ministra cursos para empresários e executivos de empresas paranaenses, de São Paulo e Rio de Janeiro sobre Comunicação e Língua Portuguesa e faz palestras sobre Investimentos. Em julho de 2007 veio um novo desafio profissional, com o blog de Economia no Portal Jornale. Em abril de 2013 passou a ter um blog de Economia no portal Jornal e Notícias. E a partir de maio de 2014, quando completou 40 anos de jornalismo, lançou seu blog independente. Nestes 16 anos de blog, mais de 35 mil matérias foram postadas. Ao longo de sua carreira recebeu 20 prêmios, com destaque para o VII Prêmio Fecomércio de Jornalismo (1º e 3º lugar na categoria webjornalismo em 2023); Prêmio Fecomércio de Jornalismo (1º lugar Internet em 2017 e 2016);Prêmio Sistema Fiep de Jornalismo (1º lugar Internet – 2014 e 3º lugar Internet – 2015); Melhor Jornalista de Economia do Paraná concedido pelo Conselho Regional de Economia do Paraná (agosto de 2010); Prêmio Associação Comercial do Paraná de Jornalismo de Economia (outubro de 2010), Destaque do Jornalismo Econômico do Paraná -Shopping Novo Batel (março de 2011). Em dezembro de 2009 ganhou o prêmio Destaque em Radiodifusão nos Melhores do Ano do jornal Diário Popular. Demais prêmios: Prêmio Ceag de Jornalismo, Centro de Apoio à Pequena e Média Empresa do Paraná, atual Sebrae (1987), Prêmio Cidade de Curitiba na categoria Jornalismo Econômico da Câmara Municipal de Curitiba (1990), Prêmio Qualidade Paraná, da International, Exporters Services (1991), Prêmio Abril de Jornalismo, Editora Abril (1992), Prêmio destaque de Jornalismo Econômico, Fiat Allis (1993), Prêmio Mercosul e o Paraná, Federação das Indústrias do Estado do Paraná (1995), As mulheres pioneiras no jornalismo do Paraná, Conselho Estadual da Mulher do Paraná (1996), Mulher de Destaque, Câmara Municipal de Curitiba (1999), Reconhecimento profissional, Sindicato dos Engenheiros do Estado do Paraná (2005), Reconhecimento profissional, Rotary Club de Curitiba Gralha Azul (2005). Faz parte da publicação “Jornalistas Brasileiros – Quem é quem no Jornalismo de Economia”, livro organizado por Eduardo Ribeiro e Engel Paschoal que traz os maiores nomes do Jornalismo Econômico brasileiro.

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