Mercado brasileiro traz barreiras econômicas para empresas

Aurélien Jacomy.
Aurélien Jacomy.

A Supply Chain é um dos pilares do desenvolvimento das empresas no Brasil. Pelo tamanho do país, o péssimo estado das infraestruturas (rodovias, portos etc.), ou também pela complexidade e rigidez da fiscalidade brasileira, é difícil atingir os níveis de produtividade da Europa ou dos Estados Unidos.

Porém, essas dificuldades aparentes não são as únicas especificidades do Brasil que podem frear o desenvolvimento de uma Supply Chain eficaz. Descobrimos ao longo dos projetos realizados aqui, que a falta de confiança que existe entre os brasileiros é a razão frequente da existência de processos morosos. Em um momento de crise econômica, também pode ser visto como uma fonte importante de ganho de produtividade.

O Brasil conheceu um período de forte crescimento econômico de 2006 a 2011. Por efeito de escala, os custos com logística caíram nesse mesmo período, sem que as empresas tenham necessidade de rever os seus processos e a organização. O custo logístico em relação ao PIB caiu nesse período de 12,1% em 2004, para 10,6% em 2010. Enfrentando a crise de 2008, as empresas americanas conseguiram reduzir os custos logísticos de 10% para 8% do PIB dos Estados Unidos. Ao contrário do Brasil, que viu seus custos logísticos aumentar durante a crise atual, para 11,5% em 2012, e 11,7% em 2014(1). Nesse período, todos indicadores no país conduzem a um aumento dos custos logísticos: aumento dos salários de 92%(2), aumento dos volumes transportadores de 42%, dos estoques de 168%, enquanto os custos da imobilização são muito elevados (14,5% em 2015(3)).

O forte desenvolvimento do Norte e do Nordeste explica também parcialmente o aumento dos custos logísticos. O aumento das distâncias, e a repartição ao longo da costa brasileira da população (enquanto o Sul e o Sudeste são organizados de uma forma mais concêntrica), encareceram a distribuição nesses novos centros. Podemos analisar os altos custos, com base em três pontos principais:

Infraestruturas: Apesar de transportar 70% das suas mercadorias por rodovia, o Brasil tem apenas 30% das suas estradas em bom estado. Essas estradas se concentram no Sul e Sudeste do país, ou ao longo da costa, o que freia o desenvolvimento do interior do país.

Complexidade do sistema fiscal: A taxa de impostos (35,7% do PIB) impacta fortemente no custo dos produtos, mas a complexidade do sistema fiscal impacta ainda mais a organização das empresas. A maioria das malhas de distribuição foram desenhadas em função de benefícios fiscais e não de uma otimização logística. A fiscalidade também desacelera os fluxos, aumentando os prazos de recebimento, bloqueando as recepções.

Burocracia : Para reduzir a fraude fiscal, o governo brasileiro desenvolveu um sistema de coleta dos impostos muito complexo, que trava o desenvolvimento da cadeia de abastecimento, especialmente no e-commerce e no omnicanal.

Tudo isso explica bem o alto custo de distribuição que as empresas brasileiras conhecem. Porém, seria um erro se limitar a razões externas, e as empresas devem procurar causas de não produtividade dentro das suas próprias organizações.

Verificar com cuidado a conta no restaurante, verificar no aplicativo Waze o caminho que o taxista escolheu, ou exigir o reconhecimento de uma assinatura no cartório são gestos comuns no Brasil que demonstram a falta de confiança entre as pessoas. Enquanto os atos de corrupções nas capas dos jornais, é muito comum observar gestos de fraude do dia dia. Um clima de desconfiança realmente existe no Brasil: “preciso verificar tudo, porque ‘o outro’ vai se aproveitar da minha ingenuidade”. Os processos logísticos no Brasil se constroem com essa convicção. Os controles se repetem ao longo da cadeia de abastecimento: do fornecedor para o cliente, de uma área para outra, ou mesmo dentro de uma mesma área.

A taxa de serviço e a qualidade dos estoques estão longes de ser exemplares. Vários estudos levantaram taxas de confiabilidade dos estoques de apenas 30% ou 40% nas lojas, inclusive logo depois de um inventário. Em vez de rever os processos, as empresas tentam desresponsabilizar seus funcionários e deixar para eles tarefas manuais, retirando qualquer processo que necessite uma tomada de decisão. Enquanto o retorno sobre investimento justifica fora do Brasil projetos de automação, o principal argumento aqui é a redução da dependência da operação à qualificação da mão de obra. O turnover alto que conhecem as empresas explica, em parte, essa decisão, mas a desconfiança nos funcionários é geralmente o principal argumento.

Apesar disso, as empresas brasileiras têm três alavancas para melhorar sua cadeia de abastecimento e aumentar sua competitividade: funcionários, fornecedores e trocas de informação. Envolver os funcionários, mesmo nos níveis mais operacionais, é um dos fatores de sucesso dos projetos no Brasil. Várias metodologias de Lean Management detalham os benefícios desse maior envolvimento, e ajudam os líderes a gerenciarem as suas equipes nesse âmbito como: um engajamento maior das equipes, e uma apropriação dos processos; uma diminuição da quantidade de erros; e uma forte melhoria tanto da produtividade individual quanto da produtividade global do centro de distribuição.

Da mesma forma, em vez de desconfiar dos seus fornecedores, as empresas devem implementar uma verdadeira cadeia de abastecimento, integrada e colaborativa, e implementar políticas que incentivam a melhoria contínua. Algumas práticas, já comuns na Europa e nos Estados Unidos, ainda são pouco desenvolvidas aqui como tarifas baseadas no custo real do abastecimento; bônus ou ônus em função da taxa de serviço ; e o uso de ferramenta de comunicação integrada para harmonizar os dados entre os atores da cadeia. A melhoria do relacionamento entre os fornecedores e os clientes, e a confiabilidade das entregas ao longo da cadeia de abastecimento, são pré-requisitos para o desenvolvimento de canais mais eficientes de distribuição, ainda pouco usados no Brasil, tais como o crossdocking ou o market place.

As empresas têm várias alavancas de redução de custos e a capacidade de aumentar a sua competitividade. No contexto econômicoatual, a Supply Chain é um eixo de evolução estratégico para as empresas brasileiras reduzirem seus custos, aumentarem suas taxas de serviço, e conquistarem novos clientes.

O artigo foi escrito por Aurélien Jacomy, que é diretor da DIAGMA no Brasil.

Mirian Gasparin

Mirian Gasparin, natural de Curitiba, é formada em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo pela Universidade Federal do Paraná e pós-graduada em Finanças Corporativas pela Universidade Federal do Paraná. Profissional com experiência de 50 anos na área de jornalismo, sendo 48 somente na área econômica, com trabalhos pela Rádio Cultura de Curitiba, Jornal Indústria & Comércio e Jornal Gazeta do Povo. Também foi assessora de imprensa das Secretarias de Estado da Fazenda, da Indústria, Comércio e Desenvolvimento Econômico e da Comunicação Social. Desde abril de 2006 é colunista de Negócios da Rádio BandNews Curitiba e escreveu para a revista Soluções do Sebrae/PR. Também é professora titular nos cursos de Jornalismo e Ciências Contábeis da Universidade Tuiuti do Paraná. Ministra cursos para empresários e executivos de empresas paranaenses, de São Paulo e Rio de Janeiro sobre Comunicação e Língua Portuguesa e faz palestras sobre Investimentos. Em julho de 2007 veio um novo desafio profissional, com o blog de Economia no Portal Jornale. Em abril de 2013 passou a ter um blog de Economia no portal Jornal e Notícias. E a partir de maio de 2014, quando completou 40 anos de jornalismo, lançou seu blog independente. Nestes 16 anos de blog, mais de 35 mil matérias foram postadas. Ao longo de sua carreira recebeu 20 prêmios, com destaque para o VII Prêmio Fecomércio de Jornalismo (1º e 3º lugar na categoria webjornalismo em 2023); Prêmio Fecomércio de Jornalismo (1º lugar Internet em 2017 e 2016);Prêmio Sistema Fiep de Jornalismo (1º lugar Internet – 2014 e 3º lugar Internet – 2015); Melhor Jornalista de Economia do Paraná concedido pelo Conselho Regional de Economia do Paraná (agosto de 2010); Prêmio Associação Comercial do Paraná de Jornalismo de Economia (outubro de 2010), Destaque do Jornalismo Econômico do Paraná -Shopping Novo Batel (março de 2011). Em dezembro de 2009 ganhou o prêmio Destaque em Radiodifusão nos Melhores do Ano do jornal Diário Popular. Demais prêmios: Prêmio Ceag de Jornalismo, Centro de Apoio à Pequena e Média Empresa do Paraná, atual Sebrae (1987), Prêmio Cidade de Curitiba na categoria Jornalismo Econômico da Câmara Municipal de Curitiba (1990), Prêmio Qualidade Paraná, da International, Exporters Services (1991), Prêmio Abril de Jornalismo, Editora Abril (1992), Prêmio destaque de Jornalismo Econômico, Fiat Allis (1993), Prêmio Mercosul e o Paraná, Federação das Indústrias do Estado do Paraná (1995), As mulheres pioneiras no jornalismo do Paraná, Conselho Estadual da Mulher do Paraná (1996), Mulher de Destaque, Câmara Municipal de Curitiba (1999), Reconhecimento profissional, Sindicato dos Engenheiros do Estado do Paraná (2005), Reconhecimento profissional, Rotary Club de Curitiba Gralha Azul (2005). Faz parte da publicação “Jornalistas Brasileiros – Quem é quem no Jornalismo de Economia”, livro organizado por Eduardo Ribeiro e Engel Paschoal que traz os maiores nomes do Jornalismo Econômico brasileiro.

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