Nas micro e pequenas empresas as histórias se repetem

A maioria dos grandes negócios um dia foi pequeno
É interessante notar como as histórias das empresas que conseguem êxito são parecidas. Basta trocar nomes e datas, acrescentar a cada uma o seu produto específico, e o resultado será mais ou menos assim: “Era uma vez um empresário que teve uma boa ideia. Identificou no mercado uma determinada necessidade que não estava sendo atendida de modo satisfatório. Pôs mãos à obra e, com talento, sensibilidade e dedicação exclusiva, levou a proposta adiante. Hoje, é essa maravilha de empresa que todos estão vendo”.
No caso das micro e pequenas empresas, a maioria dos proprietários foi empregado alguma vez na vida. No emprego aprendeu algumas técnicas, e ao vislumbrar alguma oportunidade de mercado, saiu em frente e abriu o próprio negócio.
Hoje, 95% de todos os negócios brasileiros são formados por micro e pequenas empresas, que respondem por 30% do Produto Interno Bruto (PIB), impactando direta ou indiretamente 47% da população brasileira.
As micro e pequenas empresas também têm um papel fundamental nos estados, cidades ou bairros onde estão estabelecidas, gerando emprego e crescimento econômico. Isso porque os pequenos negócios estão diretamente relacionados com as famílias brasileiras. Inúmeros lares contam com o sustento proporcionado por elas. Os próprios empreendedores também dependem do negócio para prover o sustento de suas famílias.
Apenas uma quadra da Avenida Getulio Vargas, no bairro Rebouças, em Curitiba, ilustra bem a realidade dos pequenos negócios de todo o País. Ao percorrer esta avenida, entre as ruas Lamenha Lins e Nunes Machado, encontramos na esquina uma padaria, que também serve almoço para os trabalhadores e moradores da redondeza para incrementar o seu faturamento mensal; uma farmácia independente, que com bom atendimento aos clientes vai sobrevivendo à concorrência das grandes redes nacionais, suas vizinhas de bairro; uma sapataria familiar, que está no local há mais de 25 anos e começa a ser dirigida pela segunda geração; uma pequena lavanderia, que tem como chamarisco os serviços impecáveis; um despachante do Detran; uma loja de acessórios hidráulicos; uma pequena loja de serviços de roupas, que nas últimas semanas se reinventou e se transformou num brechó. Também não poderia faltar um petshop, que está no local há mais de dez anos. Já no fim da quadra, confirmando as estatísticas, encontra-se um imóvel abandonado que abrigou uma empresa que trabalhava com formaturas, mas que, infelizmente, não resistiu à pandemia e hoje está com suas portas fechadas.
Exemplos como esses estão presentes em todos os bairros, cidades e estados. Podem mudar os nomes das empresas e os seus proprietários, mas as histórias praticamente se repetem.
Na opinião do gestor industrial do Sebrae na Região Metropolitana de Curitiba e consultor de Inovação, Augusto Machado, a flexibilidade e agilidade dos micro e pequenos negócios permitem uma resposta rápida às demandas do mercado, promovendo a diversificação e a competitividade. “As micro e pequenas empresas são verdadeiros motores de progresso social e econômico, impulsionando o bem-estar e a melhoria da qualidade de vida das pessoas”, destaca.
Todo empresário é um apaixonado pelo seu negócio

Todo empresário é um apaixonado pelo seu negócio. Mas será que, no caso de micro e pequenos empresários, essa paixão é boa ou pode prejudicar o negócio?
Para a consultora do Sebrae/PR e diretora da VBR Brasil, Emanuele de Oliveira Solyom, existe um ditado que diz que a diferença entre o veneno e o remédio é a dose. A paixão, no sentido de o empresário confiar no seu “taco” e no seu negócio o encoraja inicialmente a empreender, a correr alguns riscos que são inerentes a qualquer negócio e superar obstáculos porque a paixão alimenta a jornada em direção à realização e sucesso, além dessa paixão transbordar e contagiar para clientes, fornecedores e também funcionários e parceiros.
Porém, na avaliação da consultora, a paixão excessiva pode atrapalhar o empresário de reconhecer friamente o que acontece no seu negócio e o faz negar ou encobrir algumas situações, como por exemplo:
- Procrastinar decisões importantes porque acha que o cenário vai mudar a qualquer momento;
- Realizar compras incompatíveis com o fluxo de caixa da empresa por um otimismo excessivo aliado a “não gostar de números e não estar acompanhando as finanças da empresa”;
- Manter produtos/serviços mesmo com margem negativa porque são seus preferidos;
- Não procurar ou aceitar ajuda (ou mesmo contratar um funcionário) para evitar abrir informações da empresa e aceitar que cometeu erros;
- Terceirizar a culpa ou responsabilidade quando as coisas não dão certo para o governo, para os clientes, mercado, sistema e não agir proativamente para corrigir.
Desafios para manter as portas abertas

O índice de mortalidade das empresas brasileiras continua alto. Segundo dados do Mapa de Empresas, do governo federal, em 2023, a cada minuto, quatro empresas fecharam no Brasil. Foram 2.153.840 de negócios extintos, representando um aumento de 25,7% em relação a 2022, quando 1.712.993 companhias já haviam encerrado suas atividades. Microempresas e empresas de pequeno porte são as que apresentaram maior proporção, com 2.049.622 e 49.631 companhias extintas, respectivamente.
Na avaliação da consultora Emanuele de Oliveira Solyom, o principal desafio hoje é a consciência do empresário sobre o seu negócio, a gestão, de onde ele está e onde quer chegar.
Para vencer esses desafios, a consultora aponta alguns pontos como fundamentais, como por exemplo:
- Conhecimento do mercado que atua, ouvir o cliente e adequar o que está vendendo;
- Estruturar os processos do negócio e treinar a equipe (mesmo que seja uma só pessoa) para que não dependa tanto do dono do negócio;
- Definir quais os controles mínimos serão necessários para a gestão do negócio e implantá-los, tais como estoque, custos e precificação, fluxo de caixa, faturamento e cobrança;
- Manter bom relacionamento com fornecedores e ter bons parceiros de negócio, sem depender exclusivamente de um;
- Conhecimento da tributação da área onde atua e exigências legais para o funcionamento;
- Acompanhar e implantar mudanças necessárias no negócio como um sistema, forma de pagamento/recebimento, e-commerce, delivery.
“É importante ir inovando e se reinventando porque o sucesso do início não garante o sucesso perpétuo”, destaca a diretora da VBR Brasil.
Tributação desestimula o pequeno a crescer?

A carga tributária no Brasil é considerada uma das mais altas do mundo, e isso tem um impacto significativo nas empresas brasileiras. Mas será que no caso das microempresas, a alta tributação e a complexidade da carga tributária é um desestímulo ao crescimento?
A consultora do Sebrae explica que muitos empresários tratam o tributo como um inimigo e fazem de tudo para não pagar ou pagar o mínimo possível. “Eu tenho visto algumas ‘engenharias’ para viabilizar isso que são bem questionáveis, pois além de gerar riscos para o empresário, também prejudica controles importantes que são necessários, como estoque, folha de pagamento, conciliações bancárias, entre outros”, alerta.
Por exemplo, para evitar sair do regime Simples, a empresa acaba abrindo outros CNPJs no Simples em nome de outras pessoas, normalmente familiares, porque se forem os mesmos sócios, o fisco vai juntar as receitas para tributar, e vai dividindo os faturamentos e os custos/despesas de forma aleatória. Agindo assim, a empresa perde no controle de estoque, uma vez que para transitar mercadoria entre CNPJs diferentes tem que ter operação de venda entre as empresas, não podendo haver transferência). Também há perdas no custo com a pessoa que trabalha para todas essas empresas; no custo de mercadoria que foi comprada por uma empresa e está sendo vendida por outra; no controle bancário, que acaba usando recurso de uma empresa para pagar a conta de outra, e assim por diante.
Tributo é parte do custo do produto ou do serviço
“O tributo tem que ser encarado como parte do custo do produto ou do serviço e também do resultado do negócio. Por isso, deve ser incluído na conta da precificação e da apuração de resultados. Da mesma forma que outros custos e despesas”, explica Emanuele.
Nesse sentido, a consultora destaca que é fundamental estudar a melhor forma de tributação, qual regime pode beneficiar mais a empresa, qual localidade, mas levando em consideração o aspecto legal e de risco.
Conselhos para quem está começando a empreender
Brasil tem 42 milhões de potenciais empreendedores, segundo pesquisa realizada pelo Sebrae e Associação Nacional de Estudos em Empreendedorismo e Gestão de Pequenas Empresas. O cenário pode mais que dobrar nos próximos três anos devido ao número de pessoas que pretendem iniciar um novo negócio. De acordo com o estudo, 60% da população adulta do Brasil sonham em ter um negócio próprio.
Para os futuros empreendedores que querem ter um negócio, a consultora do Sebrae e da consultoria e auditoria, VBR Brasil, Emanuele de Oliveira Solyom, dá algumas dicas.
Em primeiro lugar, o fundamental é se formalizar. Ter o CNPJ vai facilitar as compras e as vendas.
Para quem está começando, alguns cuidados devem ser tomados para não queimar na largada, como avaliar e estudar bem o negócio que está começando;
Usar ferramentas já disponíveis no Sebrae, como o Canvas, plano de negócio;
Conversar com fornecedores para entender como funciona a área, prazo de pagamento, de recebimento, estoque mínimo.
Conversar com outros empreendedores para trocar experiências.
Pesquisar e visitar negócios parecidos.
Além do negócio, é fundamental o empresário se conhecer, saber seus limites e suas expectativas e saber diferenciar negócio de hobby e diferenciar liberdade/flexibilidade do “não ter patrão”. Por exemplo, o empresário gosta de fazer churrasco com os amigos no final de semana, aí decide abrir uma churrascaria. São coisas bem diferentes fazer churrasco para amigos e ser dono de uma churrascaria.
“Dificilmente o empresário terá todos os recursos para começar, mas é importante estruturar em fases, com o que pode começar, qual será o investimento inicial, quanto tempo pode se dedicar ao negócio, fazendo o que, qual será o expediente, a partir de que momento pode ter funcionário, para fazer o que. Uma grande ideia sem planejamento e ação é só um sonho, mas muitas ações sem uma visão ou coordenação podem virar um pesadelo”, conclui.